CLÉLIA IRUZUN LANÇA CD DEDICADO A ERNESTO NAZARETH

Alexandre Dias 24.08.2015

A pianista Clélia Iruzun, uma das maiores divulgadoras do repertório brasileiro para piano, lançou neste ano o CD “Ernesto Nazareth – Portrait of Rio”, pela gravadora britânica Lorelt. Em uma entrevista para o site EN150, Clélia conversou com Alexandre Dias sobre seu novo CD e sobre sua trajetória ligada a Nazareth.

AD - Você se lembra de quando e como foi seu primeiro contato com a obra de Ernesto Nazareth?

CI - A primeira peça que me lembro de ter ouvido talvez com uns 7 anos de idade foi o Batuque, que a professora Dulce Vaz de Siqueira tocava para mim. Eu estudava com a sua assistente, Maria Augusta Brasil da Silva, mas ia tocar para D. Dulce ocasionalmente. A primeira peça que estudei de Nazareth foi Odeon, e mais tarde aprendi a valsa Turbilhão de Beijos, que gravei para um programa da TV Globo com o clarinetista Abel Ferreira.

AD - Dentre os seus vários professores estão Arnaldo Cohen e Miguel Proença, que gravaram músicas de Nazareth. Você chegou a trabalhar peças de Nazareth com eles, ou com algum outro professor desde a infância?

CI - Mesmo quando estava trabalhando o repertorio tradicional como estudos, sonatas, etc, sempre tocava musicas brasileiras paralelamente com meus professores incluindo tambem D. Anna Carolina Pereira da Silva e depois Miguel Proença e Arnaldo Cohen.

AD - Você também teve contato com os compositores Francisco Mignone (que dedicou a você as belas Cinco peças para piano em 1976) e Arnaldo Rebello, ambos admiradores de Ernesto Nazareth. Eles tiveram alguma influência em seu repertório, especialmente na incorporação de composições brasileiras?

CI - O contato que tive com Francisco Mignone e Arnaldo Rebello foi muito importante na minha descoberta da riqueza da musica brasileira. Eu me lembro de ouvir ambos compositores tocando suas obras e de outros compositores também, inclusive Nazareth. Foi muito inspirador.

AD - Em 1998, você gravou o Brejeiro e o Odeon no eclético CD “Latin American Dances”. Ali foi a primeira vez que você incluiu músicas de Nazareth em seu repertório de concerto?

CI - Já tocava várias peças de Nazareth desde criança, inclusive em recitais, mas essa foi a primeira vez que gravei suas obras.

AD - Há poucos meses você lançou o excelente CD “Ernesto Nazareth – Portrait of Rio” (Lorelt LNT139), com 18 faixas que exploram um lado ainda pouco conhecido da obra de Nazareth (seu disco segue uma tendência recente de incluir peças ainda pouco gravadas como Cacique, Marietta e Recordações do Passado, e exclui o famoso tríptico “Odeon/Brejeiro/Apanhei-te cavaquinho”. Como foi a escolha do repertório?

CI - Devo agradecer a voce por me informar sobre obras de Nazareth que não conhecia, inclusive a Polonesa. O trabalho do site Ernesto Nazareth 150 anos é maravilhoso, pois disponibiliza toda a obra de Nazareth, inclusive com ótimas informações sobre a obra e o autor. O objetivo principal desse CD é mostrar a versatilidade do Nazareth.  A escolha foi muito difícil porque todas as obras são de excelente qualidade, mas achei importante incluir os diferentes gêneros como as peças clássicas que ele tanto gostava de tocar como a Polonesa, a sua esquecida Marcha Fúnebre, um dos fox-trots, alguns tangos menos tocados como o Cacique e a maravilhosa e simples valsa Recordações do Passado.

AD - Como foi o processo de estudo das peças? As músicas de Nazareth são muito comparadas às de Chopin por seu alto nível pianístico. Pode nos falar um pouco sobre sua impressão de sua obra, como pianista?

CI - Suas peças são extremamente pianísticas e exploram muito bem os efeitos do instrumento. Não são peças fáceis porque Nazareth era um excelente pianista. Além dos desafios técnicos como muitas oitavas e saltos nos acompanhamentos da mão esquerda, a obra requer um estudo cuidadoso para soar sempre fluente valorizando as linhas melódicas.

AD - O biógrafo Luiz Antonio de Almeida observou que sua intepretação do tango Escovado é idêntica à do próprio Nazareth (gravada em em um 78-RPM em 1930). Você ouviu muito as gravações do próprio Nazareth?

CI - Assim que vi o comentario de Luiz Antonio fiquei pensando por que seria que o meu Escovado lembraria o do próprio Nazareth.  Eu ouvi sim sua gravação e gostei da sutileza com que ele toca. Isso deve ter ficado no meu subconciente e acabou influenciando a minha gravação. Nazareth falava que suas obras eram para serem ouvidas e não dançadas, daí a valorização das linhas melódicas e inflexões rítmicas mais discretas e sofisticadas.

AD - Como foram os recitais de lançamento até agora? O público europeu tem sido receptivo?

CI - A receptividade tem sido muito boa pois Nazareth não é totalmente desconhecido na Europa. A imagem dele é como se fosse o Scott Joplin do Brasil, portanto ficam surpresos ao ouvirem outros gêneros que nao sejam tangos como por exemplo suas obras clássicas.  Por enquanto toquei um grupo de peças do CD na Inglaterra e na Itália mas continuarei em outros países também. Tive também a oportunidade de dar uma entrevista na BBC Radio 3 em que toquei o Escovado, o Suculento e uma valsa de Chopin para mostrar sua influência na obra do Nazareth. Falei também bastante do processo de escolha do CD e das obras estarem disponíveis online. Dede então, a BBC vem tocando o CD e escolheram o Escovado como um dos melhores momentos desse programa de entrevistas.

Neste vídeo de divulgação, Clélia Iruzun fala (em inglês) sobre diversas peças de Nazareth que estão em seu novo CD.

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COMENTÁRIOS

Luiz Antonio de Almeida - 27.08.2015

PARABÉNS !!!

É sempre muito prazeroso quando um grande artista resolve dividir com todos nós, momentos de sua trajetória profissional. Conheço a Clélia desde que ela, praticamente, deixara a adolescência... E sempre me surpreendi ao acompanhar, mesmo à distância, toda a sua evolução como pianista... Parabéns à Clélia por essa entrevista tão esclarecedora e ao Alexandre Dias por suas perguntas inteligentes e simpáticas...

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