Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
CLUBE DO ENGENHO VELHO (1885)
CLUBE DO ENGENHO VELHO (1885)
Sábado, dia 27 de junho, encontramos o nome de Nazareth constando em mais um concerto promovido pelo Club do Engenho Velho; quando, juntamente com Alfredo Pereira, interpretou a fantasia para dois pianos sobre a ópera Norma, de Vincenzo Bellini (1801/1835), “arranjada” por Sigismond Thalberg (1812/1871), pianista e compositor de origem germânica, rival de Liszt. É interessante, também, observarmos, nas palavras publicadas em o Jornal do Commercio, o comentário elogioso dirigido à execução dos dois rapazes, Ernesto e Alfredo, a presença outra vez de Julieta Bevilacqua e, finalizando, o fato de não aparecer, em nenhum momento, o prenome Ernesto, dando-me a impressão de que o pianista já seria tão popular que bastava citar-lhe unicamente o sobrenome.
CLUB DO ENGENHO VELHO - Esteve extraordinariamente concorrido o 31º concerto dado na noite de ante-hontem por esta sociedade. O numero de senhoras da nossa melhor sociedade, que se apresentárão na festa de ante-hontem, parecia ainda mais avultado do que de costume. O concerto, que começou ás 9 horas da noite, constou de 12 trechos, escolhidos por mão habil, e executados de modo a agradar, mesmo aos exigentes. Abri-o uma Marcha Triumphal, para dous pianos, de Carlos de Mesquita, bem executada, pelas Sras. Emma e Amalia Weguelin. Esta marcha, dedicada a Marmontel, e que neste concerto se executou pela primeira vez, é peça em que se divisão as hesitações de um artista que, ao alvorecer na carreira de compositor, enceta os estylos e maneiras dos mestres mais em voga. A harmonia, escripta debaixo dos severos preceitos escolares, tem o que quer que é estranho e que a principio não deixa de impressionar pouco agradavelmente. O motivo principal da marcha é feliz e está bellamente arranjado para dous pianos. Nesta peça ha, em todo o caso, prenuncios de um bom compositor: poucos têm começado tão bem, e muitissimos peior. A jovem Sra. D. Helena Baptista Franco, que possue bella e volumosa voz de soprano, cantou com expressão uma aria de Donizetti, Betty in questo semplice modesto usilo e o celebre duetto do 2º acto da Aida de Verdi, entre Aida e a princeza Amneris. Interpretou a parte de Amneris neste duetto a Sra. Elizabeth Wright, que tem uma boa voz de contralto, bastante volumosa nas notas agudas, e que cantou tambem o Lamento della medicante, da opera Propheta. A Sra. D. Presciliana Castro, que tambem possue boa voz de soprano, foi muito applaudida na aria Lavra dorata del mio pensiéro, da opera Ruy-Blas, de Marchetti, e na cavatina O splendida notte, da opera Cinq-Mars, de Gounod. A Sra. D. Julieta Bevilacqua executou ao piano o Nocturno n. 5 de Chopin e a valsa Favorita de J. Raff. Esta menina, uma das muitas que tem desenvolvido as suas vocações musicaes nas partidas do Club do Engenho Velho, possue execução nitida e correcta e sabe aproveitar as lições do seu habil mestre e pai. Foi executada em dous pianos uma fantasia sobre motivos de Stabat Mater, de Labée, pela Sra. E. Regina Naylor e o Sr. J. de Serqueira. Os Srs. Nazareth e Alfredo Pereira, dous moços estudiosos e que se dedicão com afinco ao piano, executárão bem uma grande e difficil fantasia da opera Norma, arranjada por Thalberg. A Sra. D. Violante Quintal executou muito correctamente ao piano a Celèbre Balade, para piano de Gounod. O Sr. Porto Junior que executou um trecho de flauta, apezar de apresentar-se como simples amador, póde considerar-se um jovem artista no instrumento que escolheu. Executou um Concert Stock, de Popp, peça difficil e fatigante. O Sr. Porto Junior sustentou o folego até á escala final, que nitidamente fez, recebendo ao terminar uma salva de applausos. A festa continuou n’um baile que terminou ás 4 horas da madrugada, sendo poucas as familias que se retirárão antes desta hora. A directoria, como sempre, não poupou finezas para os seus convidados e continua a mostrar o maior interesse pelo bom desempenho das peças concertantes.
JORNAL DO COMMERCIO. Rio de Janeiro, 29 de junho de 1885;