Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
SEGUNDO ENCONTRO DE MIGNONE COM NAZARETH (1924)
SEGUNDO ENCONTRO DE MIGNONE COM NAZARETH (1924)
Conforme disse, anteriormente, Francisco Mignone esteve, pelo menos, duas vezes com Ernesto Nazareth: uma em 1918, e outra em 1924.
Dessa feita, Mignone veio ao Rio, especialmente de Milão, Itália, para a estréia de sua ópera O contratador de diamantes, no Theatro Municipal, aos 20 de setembro.
E segundo encontro, como já informei, deu-se à Casa Carlos Gomes, situada, desde 1922, em novo endereço: Rua do Ouvidor, nº 153.
Em documentário feito pelo cineasta João Carlos Horta, intitulado Lição de piano, o saudoso Chico Bororó confunde-se ao falar de seu segundo encontro com Ernesto como se fosse o primeiro. Vamos às suas palavras.
Conheci Nazareth mais ou menos em 1917 (foi em 1918!), pela casa de música de Eduardo Souto (não, Cinema Odeon). Ernesto Nazareth havia sido contratado para tocar, ao piano, obras que os fregueses desejavam comprar. Mas, antes de comprar, como era moda naquele tempo, queriam ouvir a música, e o Nazareth lá ía ao piano... Pelo que verifiquei, ele tinha uma boa leitura, pois qualquer música que colocavam, à frente dele, lia-a com muita facilidade. Naturalmente, ele tinha uma espécie de cacoete. Quando tocava, inclinava-se do lado esquerdo. Depois me disseram que era devido a uma deficiência de audição. Ele ouvia pouco. Então, para ouvir melhor, inclinava-se. Ele tinha uma mão grossa, pesada, dedos bastante volumosos; mas, o som que ele tirava do piano era bonito (aveludado). E tocava tudo devagar, procurando sempre “cantar”. Enquanto Nazareth tocava, fui me chegando e, certamente, interrompi-o dizendo:
- Eu também toco obra sua!...
Ele ficou assustado...
- O senhor já toca?...
- Eu toco o Brejeiro... Se me der licença, vou tocá-lo para ver o que o autor acha...
Então, sentei o pé... E comecei a tocar, com muito entusiasmo... Aí, o Nazareth disse:
- Mas essa não é minha música!!!
- Como assim?...
- Eu toco desse jeito...
Então, sentou-se ao piano e tocou... Tudo bem lento... Bem “cantado”...
- Aliás, toda a minha música é estropiada!... Eles tocam tão depressa!... O “Apanhei-te, cavaquinho!” é um desastre!!! Aquilo é bem devagar, arpejando a mão esquerda, dando a impressão de cavaquinho...
Ele tocava tudo lento e bem claro. Bem que se via que tinha tido uma boa escola de “canto”... Coisa que eu perguntei a ele. Ele, então, me disse que tocava muito Chopin. Chopin era o autor favorito, e que tocava as “Baladas” quase todas de Chopin...
Francisco Mignone
MIGNONE, Francisco (Paulo). “Lição de piano”. Curta-metragem de João Carlos Horta (1977). Centro Técnico Audiovisual - CTAv / Funarte - Ministério da Cultura (EMVÍDEO). Rio de Janeiro;
Em reportagem de Lena Frias para o Jornal do Brasil, Mignone comenta mais um pouco sobre o assunto:
- Conheci Ernesto Nazareth pessoalmente, na Casa Eduardo Souto (Casa Carlos Gomes), na Rua do Ouvidor. Ele executava as suas próprias peças ao piano, para as pessoas eventualmente interessadas na compra de partituras. Eu disse então a ele que gostava das suas músicas e já tocava algumas delas. Nazareth perguntou quais, eu disse, e ele interpretou para mim Brejeiro, Escovado e Bambino. Ele tocava devagar, fazia com que o piano cantasse. Era um jeito tal, que parecia mesmo que o piano cantava.
Francisco Mignone
JORNAL DO BRASIL. Entrevista concedida por Francisco Mignone à jornalista Lena Frias. Rio de Janeiro, 1978;