Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
BRASÍLIO ITIBERÊ
BRASÍLIO ITIBERÊ
Por sua vez, Brasílio Itiberê, pseudônimo do ilustre musicólogo Brasílio Ferreira da Cunha Luz (1896/1967), também deixou registro de um enconto seu com o famoso pianista. Porém, tal episódio teve como cenário outro cinema: o popular Olympia.
Eu era menino, já andava estudando piano e tocando sem grande entusiasmo as primeiras Sonatas de Mozart. Um domingo, depois de me ter divertido muito na “Maison Moderne”, no antigo Largo do Rocio, caminhava a pé pela rua Visconde do Rio Branco, quando parei em frente ao velho cinema Olímpia.
Qualquer coisa de estranho me chamou a atenção. Na sala de espera do cinema, um autêntico pianeiro carioca botava para o ar umas melodias tão novas que eu fiquei inteiramente fascinado.
Quando o homem parou, notei que ele tinha um ar inspirado, usava bigodes à kaiser e ostentava um enorme solitário de vidro no dedo minguinho.
Um piano de armário incrível, com dois castiçais de metal azinhavrado, enfeitado com cortinas furta-cor e o teclado tatuado e carcomido de pontas de cigarro. Mas daquela arataca velha, transformada em cinzeiro, surgiam melodias tão belas, ritmos tão ágeis - que me deixaram completamente basbaque.
O pianeiro notou o meu entusiasmo de menino, convidou-me para tocar alguma coisa. Eu abanquei, e ali mesmo comecei a tirar de ouvido os primeiros tangos de Nazareth.
Esse pianeiro dengoso, macio, gostoso, por quem as meninas se apaixonavam e que tocava a “Dalila” ou improvisava para elas recitarem - é uma tradição que desapareceu. A técnica brutal de percussão do piano de jazz deturpou e matou o último pianeiro carioca. Só quem ouviu tocar um Aurélio Cavalcanti, o Porfírio da Alfândega, o Chirol, o Garcia Cristo ou o Xandico, pode ter uma idéia bem nítida do que foram esses beneméritos e avaliar a importância da sua função social.
Brasílio Itiberê
BOLETIM LATINO-AMERICANO DE MÚSICA. Ernesto Nazareth na Música Brasileira. Brasílio (Ferreira da Cunha Luz) Itiberê. Ano VI, tomo VI. Rio de Janeiro, abril de 1946;
Contou-me, certa feita, meu ilustre amigo Aloysio de Alencar Pinto, que no cinema Olympia, Nazareth também tocava acompanhando as fitas. Mas tal atividade, pelo menos para o compositor, seria extremamente constrangedora, pois somente assim poderíamos compreender a seguinte exigência:
Ele só ía para o piano quando as luzes da sala de projeção estavam todas apagadas, pois não queria que ninguém visse que era ele quem estava alí. E isso fazia parte do combinado.
Aloysio de Alencar Pinto
ALENCAR PINTO, Aloysio de. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro, s/d;