Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
RECORDANDO MIGNONE
RECORDANDO MIGNONE
Em um domingo, 2 de setembro de 1984, a pianista Maria Josephina Mignone apresentou-se no restaurante Equinox, à Rua Prudente de Morais, no bairro de Ipanema, em recital comemorativo dos 88 anos do maestro Francisco Mignone, completos no dia seguinte.
Apesar da noite chuvosa, o lugar ficou repleto de amigos, entre os quais Miguel Fustagno, Maria Alice Saraiva, Ilze Trindade, Maria Helena Coelho de Andrade e Juliana Wagner. Havia, também, uns poucos clientes que ficaram surpresos com toda aquela movimentação.
Na primeira parte do programa, ouviu-se Chopin. E na segunda, Maria Josephina tocou obras do marido.
E depois de tão boa música, foi a vez de apreciarmos a entrada triunfal de um delicioso bolo de sorvete, acompanhado do “Parabéns pra você”. À mesa, com o maestro, achavam-se Maria Josephina, Anete Rubin, filha do casal, e eu. E quanto ao bolo, comemos, eu e Mignone, cada um, três taças bem caprichadas.
Mais tarde, alguns convidados pediram ao insigne compositor que tocasse um pouco. Ele recusou por duas vezes. Na primeira, disse não ser de bom tom, pois a noite era de Maria Josephina. Em seguida, informou-nos que havia sete meses não punha as mãos em um piano.
Nesse meio tempo, pedi a ele que se por acaso resolvesse dedilhar qualquer coisa, não se esquecesse do Brejeiro. O maestro pareceu-me desatento. Também não insisti...
Porém, logo depois, levantou-se e foi para o piano. Os presentes ficaram em silêncio. Mignone começou a tirar uns acordes e o gerente aproximou-se dele fazendo os salamaleques de praxe. O maestro, então, reclamou da afinação. Realmente, o piano estava meio ruinzinho, mas “dava-pra-passar”. O “Rei da Valsa” era um artista exigente; ainda assim, pôs-se a tocar.
E para minha alegria, e grande honra, a primeira música que saiu de seus dedos foi Brejeiro, a mesma que ele passara a impressão de não ter me ouvido pedir. Homem curioso esse Mignone!...
Depois, para encerrar, interpretou dois estudos seus, bem complicados. A TV Manchete registrou o momento, sendo importante e de grande interesse descobrir se ainda existem essas imagens.
Francisco Mignone estava feliz, cercado da família, dos amigos, dos aplausos e diante do piano, seu companheiro por mais de oito décadas. Foi a última vez que tocou em público, e a derradeira a pôr suas mãos no instrumento. E Ernesto Nazareth “fez-se” presente!...