Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
A IMPORTÂNCIA DE ERNESTO NAZARETH
A IMPORTÂNCIA DE ERNESTO NAZARETH
Quanto à importância de Ernesto Nazareth na Música Brasileira, sempre que indagado a esse respeito, ora me via atrapalhado na improvisação de uma resposta que pudesse mostrar o meu domínio sobre o assunto, ora repetia citações de autores consagrados que ratificavam minhas conclusões e me livravam de cometer os exageros típicos de admirador extremado. Portanto, o que se segue, de forma direta e descomplicada, ainda que extensa, trata-se de uma dissertação muito interessante.
A relevância de uma manifestação artística estará sempre sujeita à reação, positiva ou não, que a ela se seguir. Logo, a partir do momento em que alguém, ou movimento, interfere de forma significativa em esquemas já estabelecidos, temos algo verdadeiramente importante.
Quando Ernesto Nazareth surgiu, no final da década de 1870, ainda não existia uma música “genuinamente brasileira”, mas, sim, “feita no Brasil”. A maioria dos compositores da época sequer imaginava a possibilidade de se expressar por meio de uma linguagem eminentemente nacional. Poucos foram, e cada qual a seu modo, os que desenvolveram algo nesse sentido. E isso nos leva a reconhecer como a geração dos desbravadores aquela representada pelos seguintes nomes (em ordem cronológica): Henrique Alves de Mesquita, Antonio Carlos Gomes, Brasílio Itiberê da Cunha, Francisca Edwiges Neves Gonzaga, Joaquim Antonio da Silva Callado Júnior, Ernesto Nazareth, Alexandre Lévy e Alberto Nepomuceno.
Parece-me, contudo, que dentre esses foi Nazareth, talvez, quem melhores resultados alcançou quanto à sistematização da nossa música.
Com lucidez incomparável, sincretizou danças européias com algumas formas coreográficas brasileiras, dando-lhes novas cores mediante a aclimatação e ambientação do material rítmico-melódico. Esse processo de tropicalização de formas estrangeiras que, inspirado em constâncias populares, foi sistematizado, via Nazareth, e, em seguida, adotado pelo povo. (...) Foi, sem dúvida, dentro de sua época, a mais importante contribuição realizada em prol da música brasileira.
Aloysio de Alencar Pinto
REVISTA BRASILEIRA DE MÚSICA. Ernesto Nazareth - Flagrantes. Aloysio de Alencar Pinto. Ano II - nº 5. Rio de Janeiro, abril / junho de 1963;
A posição de Ernesto Nazareth, na história da música brasileira, é da maior importância, porque foi ele o fixador, na pauta musical, de fórmulas melódicas, de esquemas harmônicos e de células rítmicas que se tornaram representativas da musicalidade nacional. (...) Para o piano, Nazareth canalizou toda aquela música que andava dispersa pelas esquinas. O formulário rítmico e melódico do choro e da seresta carioca, a gíria improvisatória do maxixe, tudo isso Ernesto Nazareth captou, refinou, filtrou, transfigurou e condensou na sua obra pianística.
Mozart de Araújo
REVISTA BRASILEIRA DE CULTURA. Ernesto Nazareth. (José) Mozart de Araújo. Ano IV - nº 12. Rio de Janeiro, abril / junho de 1972;
Outros compositores, contemporâneos de Nazareth, notadamente Alves de Mesquita, Callado e Anacleto de Medeiros, também escreveriam música com tendência nacionalista. A influência de Ernesto Nazareth sobre compositores populares e eruditos foi e continua evidente. Até musicistas da envergadura de Villa-Lobos se louvaram da obra nazarethiana para soluções artísticas e estéticas.
Francisco Mignone
MIGNONE, Francisco (Paulo). Música. MEC / Bloch Editores. Rio de Janeiro, 1980;
Ernesto Nazareth completa a tríade (com Joaquim Antonio da Silva Calado e Chiquinha Gonzaga) de autores que mais significação tiveram nesse processo de fixação de um tipo nacional de música, para o qual os compositores “sérios” começam a pilhar cobiçosamente.
Luiz Heitor
JORNAL DO COMMERCIO. Centenário de Ernesto Nazareth. Luiz Heitor (Corrêa de Azevedo). Rio de Janeiro, 17 de março de 1963;
Realmente, alguns dos mais importantes músicos brasileiros, como Villa-Lobos, Mignone, Lorenzo-Fernandez (1897/1948), Camargo Guarnieri (1907/1993) e Marlos Nobre (1939), beberam da fonte nazarethiana.
É a verdadeira encarnação da alma musical brasileira; ele transmite, na sua índole admirável, espontaneamente, as emoções vivas de um determinado povo, cujo caráter apresenta tipicamente na sua música.
Heitor Villa-Lobos
ALMEIDA, Renato (Costa). História da Música Brasileira. Editora F. Briguiet. Rio de Janeiro, 1926;
Todavia, estaria Villa-Lobos se referindo à “alma brasileira” de qual região: norte, sul, sudeste, centro-oeste?...
Ernesto Nazareth não é totalmente um representante da alma brasileira. Falta-lhe a generalidade dos assuntos de cunho nacional. Está mais ligado à terra em que nasceu. É um maravilhoso compositor carioca. Seus achados rítmicos sugerem o ambiente do meio em que viveu e somente depois irão, talvez, consubstanciar modismos nacionais de ordem geral.
Baptista Siqueira
SIQUEIRA, (João) Baptista. Ernesto Nazareth na Música Brasileira; ensaio histórico-científico. Gráfica Editora Aurora Ltda. Rio de Janeiro, 1967;
Também não me parece ter sido Ernesto Nazareth “inventor” de ritmos, como afirmam alguns pesquisadores. O que ele fez, como tantos de sua geração, foi passar para a pauta vários ritmos já sistematizados, acrescentando-lhes, porém, características particulares à sua personalidade e criando, com isso, um estilo próprio, mão não um “ritmo novo, original!...” Houve, até, quem tentasse rebatizar o “tango brasileiro” de “nazarethxixe”, o que, apesar de ser muito simpático, é absolutamente descabido.
Quanto a classificar Ernesto Nazareth de músico erudito ou popular, a princípio convém esclarecer que existe uma corrente entre os críticos que prefere o termo clássico ao erudito. Meu saudoso amigo Luiz Paulo Horta (1943/2013) era o principal defensor da substituição do termo “erudito” pelo “clássico”. Para mim, essas duas expressões se aplicam perfeitamente ao nosso compositor, pois, segundo nos informa o Dicionário Aurélio, erudito se compreende por aquele “que tem erudição”, “que revela erudição” ou “que sabe muito”, e clássico por algo “da mais alta qualidade”, “cujo valor foi posto à prova do tempo”, “sem excessos de ornamentação; simples, sóbrio”, “escritor, artista ou obra consagrada, de alta categoria”. Logo, não haverá o menor engano em classificarmos Ernesto Nazareth tanto de erudito, se em sua obra encontramos todo um cabedal de conhecimento proveniente de autor bem preparado, quanto clássico, pela perpetuação do seu legado.
Ernesto Nazareth, no entanto, é um verdadeiro compositor “erudito”, o que se pode comprovar pela observação de algumas características da sua obra, que o colocam muito acima do sofrível nível técnico e artístico do músico popular: (1) melodias belas e originais, sempre diferentes de uma música para outra; (2) harmonia rica e coerente; (3) ritmo preciso e, dentro do limite imposto pela dança escolhida, variado. (4) E, acima de tudo, em sua grande produção, uma notável diversidade de soluções de técnica pianística.
Osvaldo Lacerda
ESTE BRASIL QUE TANTO AMO - CD de Eudóxia de Barros, piano. Paulinas Comep. São Paulo, 1995. Texto por Osvaldo Lacerda;
Se a música de Ernesto Nazareth tem todas as características eruditas desde a forma ao conteúdo, se mantém os princípios estéticos universais de variedade na unidade, se nos modelos formais, quer de estrutura, quer de desenhos, segue o melhor de todos os clássicos, (...) então essa música só tem um destino: “viver enquanto houver inteligência sobre a Terra”.
Baptista Siqueira
SIQUEIRA, (João) Baptista. Ernesto Nazareth na Música Brasileira; ensaio histórico-científico. Gráfica Editora Aurora Ltda. Rio de Janeiro, 1967;
Artista de formação irregular, praticamente autodidata, mas com pretensões a tornar-se grande intérprete do repertório clássico, Nazareth jamais viveria exclusivamente de recitais. Sem condições financeiras para empreender estudos e carreira no exterior ou qualquer interesse em “arrumar-se” junto ao serviço público, nosso artista encontrou seu caminho na música de temática popular, cuja linguagem estava mais próxima da realidade que o cercava.
A predominância, na sua obra, de algumas poucas danças da nossa música (tango, maxixe, valsa, polca) e a sua limitação a um só instrumento, levam muita gente a classificá-lo como compositor “popular” ou, na melhor das hipóteses, como um “semi-erudito”.
Osvaldo Lacerda
ESTE BRASIL QUE TANTO AMO - CD de Eudóxia de Barros, piano. Paulinas Comep. São Paulo, 1995. Texto por Osvaldo Lacerda;
Sua música tem sido amplamente questionada: erudita ou popular? A música pode ser erudita, folclórica ou popular. Há, no entanto, entre a erudita e a popular, aquele meio termo, a semi-erudita, na qual se enquadra perfeitamente bem a música de Nazareth, que também pode ser considerada, em outras palavras, um clássico da música popular. Assim também podemos classificar, embora não com a mesma genialidade, um Eduardo Souto, Chiquinha Gonzaga, Zequinha de Abreu ou Marcelo Tupinambá. Nazareth seria, para nós, o que Strauss foi para a Áustria.
Eudóxia de Barros
NOTÍCIAS EM PIANO FORTE. Nº 39. Eudóxia de (Campos) Barros (Lacerda). São Paulo, agosto de 1989;
Repetida em muitas citações encontramos a expressão “semi-erudito”. Dai, faz-se necessário esclarecer, de uma fez por todas, o quanto ela não se aplica corretamente à obra de Nazareth. Primeiramente, semi significa “meio” ou “metade”. E mesmo não tendo sido um musicista tão completo quanto, por exemplo, Francisco Mignone, que compôs de maxixes e cateretês até concertos, bailados, óperas e sinfonias, Nazareth também nunca foi “meio” músico ou músico pela “metade”... Classificá-lo de “semi-qualquer-coisa” só porque compôs para um único instrumento demonstra, no mínimo, falta de conhecimento do assunto.
O piano era a “praia” de Ernesto Nazareth, e só. O piano bastava-lhe, e pronto. A única pretensão de Ernesto Nazareth era criar, para o piano, algo belo, bem feito e estruturado nas mais rígidas normas musicais, pois acreditava que, dessa maneira, sua arte jamais seria relegada a um plano inferior. Ele tinha consciência de que agradando ao espírito mais sensível e ao intérprete mais exigente, sua música se tornaria imortal. E nada mais que isso...
Duas coisas dão-me imenso prazer: uma pessoa a ouvir-me com reverência e um pianista “desconcertado” ao tentar transpor alguma dificuldade encontrada em minha música!...
Ernesto Nazareth
NAZARETH SISTON, Julita. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro, s/d;
Scott Joplin (1868/1917), o similar norte-americano do nosso compositor, gastou todos os seus recursos, financeiros e físicos, na elaboração de uma “ópera-rag” intitulada Treemonisha (1911), e que só teve uma única apresentação durante a vida do autor. Joplin queria voar mais alto. É obra interessante, mas sem a mesma relevância universal alcançada com seus inimitáveis “rags” ou “ragtimes”.
Já em relação ao termo popular, devemos entendê-lo como “próprio do povo”, “feito para o povo”, “agradável ao povo” ou “vulgar, trivial, ordinário”. Nazareth não era popular, no sentido mais amplo da palavra, como Chiquinha Gonzaga (O abre-alas), Catullo da Paixão Cearense (Luar do sertão), Eduardo Souto (Tatu subiu no pau) e José Barbosa da Silva, o “Sinhô” (Gosto que me enrosco), entre outros. Ele era, sim, popularizado, ou seja: “reconhecido ou estimado do povo”.
Não se pode dizer que Ernesto Nazareth, por ter escripto tangos, valsas e polkas fosse um compositor de musica popular. Elle as compoz com tão bizarra technica e fantastica execução, que as tornou inaccessiveis aos menos conhecedores do teclado.
Mariza Lira
REVISTA PRANOVE. Ernesto Nazareth; o rei do tango brasileiro (“Galeria Sonora”). Marisa (Maria Luiza) Lira (de Araújo). Anno I - nº 7. Rio de Janeiro, dezembro de 1938;
Praticamente, tudo o que Nazareth escreveu se direcionou ao piano. E o piano nunca foi um instrumento “próprio do povo”, “feito para o povo...” O compositor, também, sempre se preocupou em dar uma concepção mais nobre à sua arte, evitando, sistematicamente, descambar para o popularesco.
Minhas músicas não foram feitas para serem dançadas; mas, sim, ouvidas!...
Ernesto Nazareth
NAZARETH SISTON, Julita. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro, s/d;
Ernesto Nazareth foi tipicamente o criador de uma obra voltada para as classes média e alta, pois dificilmente pessoas menos favorecidas adentrariam em alguma casa de música, pediriam uma partitura, pagariam por ela e chegando em casa ainda encontrariam não só o instrumento à disposição como alguém com o conhecimento necessário para interpretar qualquer peça a partir de um pentagrama.
Machado de Assis (1839/1908) disse alhures que “música popular é aquela que convida a dançar e decora-se depressa...” Levando-se já em conta suas valsas e algumas polcas, que “tangos” de Nazareth poderíamos, realmente, considerar um “convite à dança”?
Nazareth nem sequer escrevia danças para serem dançadas. A sua síntese admirável da dança urbana carioca, do choro, da seresta, é de caráter eminentemente artístico e concertístico. Não gostava de tocar suas valsas, os seus tangos, as suas polcas “para dançar”. Isso o humilhava... Queria ser “ouvido”, e se não lhe davam atenção, parava.
Andrade Muricy
MÚSICA & DISCO. Chiquinha Gonzaga. (José Cândido de) Andrade Muricy. Ano III - nº 4. Rio de Janeiro, abril de 1959;
Chiquinha Gonzaga fez e promoveu o maxixe. Nazareth, não!!! Se alguém dançou o “Brejeiro”, como maxixe, Nazareth nada teve com isso...
Baptista Siqueira
SIQUEIRA, (João) Baptista. Ernesto Nazareth na Música Brasileira; ensaio histórico-científico. Gráfica Editora Aurora Ltda. Rio de Janeiro, 1967;
(...) poderíamos apontar também o caráter anticoreográfico de muitas das obras do mestre. Autor de uma obra que se compõe, na sua quase totalidade, de peças dançantes (tangos, valsas, polcas, schottisches, quadrilhas e mazurcas), Nazareth nem sempre foi, a rigor, um autor de música para dançar. Nem todas as suas valsas, nem todos os seus tangos, embora estruturados em períodos regulares e simétricos, podem ser dançados. E pelo depoimento dos que com ele privaram, podemos afirmar que Nazareth não compunha pensando em bailes, muito embora fosse o salão o cenário preferido das suas exibições. Preferia o serão familiar ao sarau-dançante.
Mozart de Araújo
REVISTA BRASILEIRA DE CULTURA. Ernesto Nazareth. (José) Mozart de Araújo. Ano IV - nº 12. Rio de Janeiro, abril / junho de 1972;
E quanto ao “decora-se depressa”? Certamente, referia-se Machado à música de melodia simples ou possuidora de versos banais. Das 211 composições do genial carioca, apenas 19 receberam letra e destas só 9 saíram impressas.
Efetivamente, no extenso catálogo do nosso compositor, não encontramos mais do que cinco ou seis peças providas de letra. E nessas poucas peças é manifesta a ausência de vocalidade, ou seja, a ausência daquelas características que, por se adaptarem à natureza da voz humana, tornam as músicas cantáveis. (...) Antivocal e anticoreográfico, ele foi, por temperamento, um músico de salão. É daí o caráter pianístico da sua obra. Em vão procuraremos na produção dos compositores de sua categoria um domínio tão perfeito do teclado e uma técnica pianística tão aprimorada.
Mozart de Araújo
REVISTA BRASILEIRA DE CULTURA. Ernesto Nazareth. (José) Mozart de Araújo. Ano IV - nº 12. Rio de Janeiro, abril / junho de 1972;
Acentue-se, ainda, uma faceta de Nazareth a favor de suas inclinações para a música de maior esmero: a ausência completa (!) de letras. Despojando-a, assim, da característica essencial da música dita popular, justamente uma das suas razões de penetração nas camadas do povo: fusão do melódico com a poesia.
Edigar de Alencar
DIA (O). Ernesto Nazareth. Edigar de Alencar. Rio de Janeiro, 24 e 25 de março de 1963;
Chiquinha Gonzaga e Nazareth foram naturezas muito diferentes, mas que se completavam. Chiquinha Gonzaga é mais popular. A sua arte está mais próxima da canção, gênero de eficiência incomparável sobre o povo. Nazareth tentou a canção, sem êxito. Chiquinha Gonzaga estava inteiramente à vontade no terreno da música popular. Não visava, como Nazareth, a artística elevada.
Andrade Muricy
MÚSICA & DISCO. Chiquinha Gonzaga. (José Cândido de) Andrade Muricy. Ano III - nº 4. Rio de Janeiro, abril de 1959;
E como explicar a projeção alcançada por Ernesto Nazareth no meio musical de seu tempo?
Pela leitura e pelo confronto, pude verificar que as obras de Nazareth, desde as primeiras, estão situadas num plano muito superior ao das peças deixadas pelos seus colegas de ofício. (...) Apesar de bons pianeiros, nenhum deles conseguiu, como Nazareth, aquele apuro de metier, aquela fatura orgânica, em que a melodia, harmonia e ritmo se entrosam de maneira quase espontânea, onde um refinamento de expressão já extravasa os domínios da música popular, atingindo despretensiosamente o nível das criações artísticas. Ele realiza, com material que os outros desdenhavam, verdadeiros achados para a nossa música.
Aloysio de Alencar Pinto
REVISTA BRASILEIRA DE MÚSICA. Ernesto Nazareth - Flagrantes. Aloysio de Alencar Pinto. Ano II - nº 5. Rio de Janeiro, abril / junho de 1963;
Sua popularidade, inigualável em extensão e profundidade, a maior de todos os tempos, veio sendo conquistada com a insistência da boniteza e perfeição de suas composições.
Mariza Lira
DIÁRIO DE NOTÍCIAS. Brasil sonoro; o tango brasileiro. Mariza (Maria Luiza) Lira (de Araújo). Rio de Janeiro, 29 de setembro de 1957;
(...) que força poética, que pureza rítmica a desse compositor que se popularizara apenas pelo ritmo quente e gostoso das suas melodias! E, sobretudo, que fidelidade, que nativismo o seu, refletindo nas suas partituras a vida do Rio de então.
Edigar de Alencar
DIA (O). Ernesto Nazareth. Edigar de Alencar. Rio de Janeiro, 24 e 25 de março de 1963;
A julgar pela popularidade da música pianística de Ernesto Nazareth, podemos considerá-lo como o segundo compositor que realmente conseguiu atingir o grande público brasileiro amante da música, depois de Carlos Gomes. É provável que o caráter semi-popular de sua obra o tenha ajudado a penetrar em tantos lares (...); mas o que parece óbvio é que sua música obteve um lugar seguro e permanente em nossos corações.
Vasco Mariz
MARIZ, Vasco. História da Música no Brasil. Editora Civilização Brasileira S.A. Rio de Janeiro, 1983;
Se o valor intrínseco da obra de Ernesto Nazareth ajudou sobremaneira a disseminá-la, não podemos esquecer também a condição privilegiada do autor como intérprete e divulgador.
Compositor, pianista, acompanhador e professor particular de piano, nosso biografado tocou em clubes, bailes, batizados e casamentos, trabalhou em casas de música e cinemas, excursionou, gravou discos; apresentou-se em programas de rádio, etc; desse modo, alcançou uma popularidade que poucos de sua geração tiveram oportunidade de conhecer. Foram 53 anos de atividades artísticas, desde a edição da primeira música, em dezembro de 1878, até o último recital, em fevereiro de 1932. Cinco décadas de pura, sincera e proveitosa devoção à música!
Mas, se Ernesto Nazareth teve papel tão significativo na música brasileira, por que, então, passou a contar com a providencial ajuda dos filhos no final da vida, salvando-se, assim, das raias da indigência?...
Citemos três razões absolutamente significativas:
1) a geográfica:
Ele nasceu no Brasil;
2) a concernente aos Direitos Autorais:
Sabemos que somente nos dias de hoje, graças ao aprimoramento das leis autorais e respectivos dispositivos de arrecadação, pode um artista consagrado equiparar o saldo da conta bancária à projeção do seu nome;
3) a instrumental:
O piano, na condição de principal veículo de divulgação de sua arte, foi sendo substituído gradativamente pelos fonógrafos, gramofones, victrolas, rádios e rádio-victrolas.
Assim, tanto Nazareth quanto Francisca Gonzaga, Eduardo Souto, Zequinha de Abreu e Marcello Tupynambá, entre outros, foram saindo de cena. Ernesto passou a contar com o auxílio dos filhos; Chiquinha subsistiu com algumas economias mais um pró-labore da SBAT, instituição que ajudou a criar; Souto, já velho, voltou a exercer a mesma atividade de sua mocidade: bancário; Zequinha foi vender música de porta em porta; Tupynambá, cego, veio a falecer na casa comprada com dinheiro arrecadado a partir de uma subscrição pública.