Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
MÁRIO DE ANDRADE
MÁRIO DE ANDRADE
Nascido em São Paulo, Capital, aos 9 de outubro de 1893 e na mesma cidade falecido, em 25 de fevereiro de 1945, o escritor, musicólogo, folclorista, poeta, crítico e jornalista Mário Raul de Morais Andrade foi, sem dúvida, a personalidade mais importante e polêmica da musicologia brasileira da primeira metade do século XX.
Admirador de Ernesto Nazareth, tudo fez para que o compositor fosse reconhecido pelo público paulistano especializado.
Foi Mário de Andrade quem, empenhando todo o seu prestígio pessoal, impôs o nome do autor a mais refinada elite cultural de São Paulo.
Baptista Siqueira
SIQUEIRA, (João) Baptista. Ernesto Nazareth na Música Brasileira; ensaio histórico-científico. Gráfica Editora Aurora Ltda. Rio de Janeiro, 1967;
E essa mesma admiração de Mário, que culminou com a palestra do dia 17, acabaria convertida em artigo pela revista Illustração Brasileira (1928) e, mais tarde, reproduzido em seu famoso livro “Música, doce música” (1933).
Como o texto em questão é bem extenso, preferi transcrever somente uns poucos parágrafos.
ERNESTO NAZARETH
Ernesto Nazareth já entrou na casa dos sessenta, porém pra lhe compreender a musica, a vida longa dele, quase não adianta nada. Não se distingue dessa monotonia de nascer e viver, o que significa lutar, soffrendo a historia eterna do verso “A vida é um combate”, que até os indios descobrem através da metrica dos Gonçalves Dias. E por enquanto graças a Deus vae Ernesto Nazareth nas mesmas lutas e de quando em vez um gostinho coleccionado cuidadosamente... pro rei Alberto ver.
(...) No entanto, si é certo que a obra de Ernesto Nazareth tem uma boniteza, uma dinamica fora do commum, e elle apareceu e se desenvolveu no momento opportuno, não comprehendo bem como é que se tornou popularmente celebre. Si foi opportuno, não tem nada de opportunista nelle e é sabido que nem mesmo a genialidade basta para um individuo se popularizar. Ora, a primeira observação que impõe-se a quem estuda a obra dansante delle é que de todas as musicas feitas para as necessidades coreographicas do povo, é a menos tendenciosamente popular que pode haver.
(...) Por estes caracteres e excellencias, a riqueza rhytmica, a falta de vocalidade, a cellularidade, o pianistico, muito feita de execução difficil, a obra de Ernesto Nazareth se distancia da producção geral congenere. É mais artistica do que a gente imagina, pelo destino que teve e deveria de estar no repertorio dos nossos recitalistas. Posso garantir que não estou fazendo nenhuma affirmativa sentimental não. É a convicção desassombrosa de quem desde muito observa a obra delle. Si alguma vez a prolixidade encomprida certos tangos, muitas das composições deste mestre da dansa brasileira são criações magistraes, em que a força concepcional, a boniteza da invenção melódica, a qualidade expressiva estão dignificadas por uma perfeição de forma e um equilibrio surpreendentes.
(...) Esta homenagem prestada a Ernesto Nazareth pela Cultura Artistica de São Paulo me parece que é symptomatica de tempos mais uteis, além de ser justissima. E é um gosto a gente constatar que não se carece aqui de garantia da policia como succedeu no Instituto Nacional de Musica em 1922 quando num concêrto organisado por Luciano Gallet ahi se executou o Brejeiro, o Nênê, o Bambino e o Turuna. Satisfeito mesmo estou eu e apesar de atravessado de enfermidades mesquinhas fiz gosto em alinhavar na fadiga estas phrases para vir junto dos senhores trazer o meu applauso a um artista que usando a politica subtil do talento se fez escutar por uma nação.
Mário de Andrade
ILLUSTRAÇÃO BRASILEIRA. Ernesto Nazareth. Mário (Raul) de (Morais) Andrade. Anno IX - nº 94. Rio de Janeiro, junho de 1928;