Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
ERNESTO NAZARETH - RESUMO BIOGRÁFICO
ERNESTO NAZARETH
Ernesto Júlio de Nazareth nasceu na cidade do Rio de Janeiro, aos 20 de março de 1863. Filho de Vasco Lourenço da Silva Nazareth, despachante aduaneiro, e Carolina Augusta da Cunha Nazareth, teve como local de nascimento a casinha identificada pelo nº 9, da Rua do Bom Jardim (atual Rua Marquês de Sapucaí), num dos flancos do Morro do Nheco (depois chamado Morro do Pinto), entre os bairros de Santo Cristo e Cidade Nova.
Ainda criança, começou a estudar piano com a mãe, excelente pianista. Já aos 10 anos, sofreu violenta concussão na cabeça, ao cair de uma árvore; iniciando-se, assim, uma série de problemas auditivos que o levariam, no correr dos anos, à quase completa surdez.
Em 1874, após o falecimento de Carolina Augusta, passou a receber lições de Eduardo Madeira, amigo da família, e, mais tarde, de Charles Lucièn Lambert, afamado professor negro, de New Orleans, aqui radicado. Com o primeiro estudou cerca de ano e meio, com o segundo teve somente oito aulas. Depois disso, seguiu sozinho, fazendo-se praticamente autodidata.
Quanto aos estudos propedêuticos, estes foram ministrados pelo padre Belmonte, no Colégio São Francisco de Paula, à Praça Tiradentes.
Em 1877, com a idade de 14 anos, compôs sua primeira música, a polca-lundu Você bem sabe, editada, no ano seguinte, pela Casa Arthur Napoleão & Miguèz, situada à Rua do Ouvidor, nº 89. Dois anos depois, já com as características do “tango brasileiro”, gênero que posteriormente consagraria o seu nome, teve publicada a polca Cruz, perigo!!, rapidamente popularizada.
Aos 8 de março de 1880, portanto doze dias antes de completar a idade de 17 anos, tomou parte de um recital no Salão do Clube Mozart, podendo ter sido, esta, sua primeira apresentação pública, pois até o momento se desconhece outra com data mais antiga.
Composta e impressa em 1881, a polca Não caio n’outra!!! tornou-se, pelo número de reedições, seu primeiro grande sucesso.
Em 1885, participou de concertos nos clubes Rio Comprido, Engenho Velho, Riachuelense do Engenho Novo e São Cristóvão. No ano seguinte, ainda tocou em mais um, o Rossini, à Praça Onze.
Aos 14 de julho de 1886, na Igreja de São Francisco Xavier do Engenho Velho, casou-se com Theodora Amália Leal de Meirelles (1852/1929), que passou a assinar Theodora Amália Meirelles de Nazareth. Desta união nasceram Eulina (1887/1971), Diniz (1888/1983), Maria de Lourdes (1892/1917) e “Ernestinho” (1896/1962). Nesse tempo, já vivia da venda de suas composições, das aulas particulares de piano e de tocar em bailes, batizados e casamentos.
Em 1889, apareceu editada sua décima-terceira polca, Atrevidinha. E, à mesma época, compôs a quadrilha Chile-Brasil, que só veria publicada tempos depois (1897).
No ano de 1893, teve impressos pela primeira vez um “tango” e uma valsa: Brejeiro e Julita, respectivamente. Já por volta de 1894, começou a trabalhar como pianista demonstrador da Casa Vieira Machado & Cia., à Rua dos Ourives (depois Rua Miguel Couto), nº 51. Brejeiro tornou-se o maior sucesso de Nazareth no século XIX; no mesmo período, a valsa Helena, primeiramente editada em 1896, também viria a se tornar a mais popular, no seu gênero.
Por iniciativa do Clube de São Cristóvão, apresentou-se, em 1898, no Salão Nobre da Intendência da Guerra; desconhecem-se, contudo, a data exata e o programa executado. Já no ano seguinte, saiu a primeira edição de Turuna, “grande tango característico”.
Em 1901, Ernesto Nazareth terminou Batuque, “tango característico”. E no ano seguinte, sob os auspícios da Casa Edison (Odeon), teve uma composição sua pela primeira vez registrada em disco: Está chumbado (zon-O-phone/X-1.055), gravada pela Banda do Corpo de Bombeiros e regida por Anacleto de Medeiros.
Já em 1903, compôs a valsa Coração que sente. E mais tarde, em 1904, conheceu o célebre pianista norte-americano Ernest Schelling. Na época, comentou-se muito no meio musical carioca, o fato de o ilustre estrangeiro ter retornado ao seu país levando bom número de composições do nosso artista.
Em 1905, saiu em disco pela Casa Edison (Odeon), Brejeiro (“O sertanejo enamorado”), com letra de Catullo da Paixão Cearense e cantada por Mário Pinheiro. E, nesse ano, ainda viu as edições princeps dos “tangos” Escovado e Ferramenta; sendo que, na partitura desse último, logo abaixo do nome do autor, apareceu o mais antigo registro do epíteto “rei do tango”.
Pelo menos até o Natal de 1906, o compositor ainda se encontrava trabalhando na Casa Vieira Machado & Cia., à Rua do Ouvidor, nº 147 (novo endereço).
Em 1908, passou a trabalhar como pianista demonstrador da Casa Mozart, de propriedade do amigo português Lino José Barbosa, situada à Avenida Central (depois Avenida Rio Branco), nº 127. E entre agosto e novembro, convidado pelo maestro Alberto Nepomuceno, apresentou-se, por duas vezes, interpretando somente músicas de sua autoria, na “Exposição Nacional”, evento realizado na Praia Vermelha em comemoração pelo centenário da “Abertura dos Portos”.
Aos 6 de junho de 1909, Nazareth tomou parte em um recital realizado no Instituto Nacional de Música, à época localizado na Rua Luís de Camões, no qual interpretou, de sua autoria, a gavota Corbeille de fleurs e o “tango característico” Batuque, e ainda acompanhou, no mesmo evento, Heitor Villa-Lobos na peça Le cygne, de Saint-Saëns, para violoncello e piano. Foi também nesse ano que iniciaram suas atividades como pianista da sala de espera do antigo Cinema Odeon, à Avenida Central, nº 137, esquina com Rua Sete de Setembro.
Em 1910, editou, por conta própria, o “tango” Odeon, dedicado à empresa proprietária do estabelecimento.
Dois anos depois, registrou em discos da Casa Edison (Odeon), acompanhado pelo flautista Pedro de Alcântara, seus “tangos” Odeon e Favorito, mais as polcas Linguagem do coração, de Callado, e Choro e poesia, do próprio Alcântara.
Em 1913, deixou o Odeon, continuando, porém, com seus afazeres junto à Casa Mozart. São desse ano, também, as edições do “tango característico” Batuque, dedicado ao maestro Henrique Oswald, e da valsa Confidências, dedicada ao poeta e trovador popular Catullo da Paixão Cearense. A polca Apanhei-te, cavaquinho!..., publicada em 1914, alcançaria retumbante sucesso, sendo da mesma época a edição de um catálogo da Casa Beethoven (Nascimento Silva & Cia.), situada à Rua do Ouvidor, nº 175, no qual constavam os títulos de 19 composições de Nazareth gravadas em rolos de pianola, confeccionados nos Estados Unidos da América.
Em 1917, retornou ao Cinema Odeon, agora exercendo também a função de pianista de uma pequena orquestra, na qual Villa-Lobos tomava parte como violoncelista. No dia 1º de dezembro faleceu com 25 anos, em conseqüência de profunda anemia, sua filha Maria de Lourdes.
Já no ano seguinte, saiu definitivamente do Odeon, sendo oportuno lembrar que em sua segunda temporada junto a esse estabelecimento, Ernesto Nazareth conheceu Arthur Rubinstein, Darius Milhaud e Francisco Mignone.
Em 1919, começou a trabalhar como pianista demonstrador da Casa Carlos Gomes, à Rua Gonçalves Dias, nº 75, de propriedade do também pianista e compositor Eduardo Souto. E dois anos depois, Villa-Lobos dedicou a ele a peça Choros nº 1, para violão.
Quanto ao “tango” O futurista, terminado e primeiramente editado em 1922, o autor procurou mostrar aos “modernistas” da época que “mesmo que uma música apresente dissonâncias, não precisa ser, necessariamente, desprovida de alguma beleza!...” E aos 16 de dezembro, a convite de Luciano Gallet, interpretou no Instituto Nacional de Música, à Rua do Passeio, nº 98, seus “tangos” Brejeiro, Nenê, Bambino e Turuna.
No final de 1925, deixou a Casa Carlos Gomes, passando a dedicar-se aos preparativos de uma turnê por São Paulo. E em abril de 1926, partiu para a terra dos bandeirantes, vindo a se apresentar, inclusive, em suas mais importantes salas: Theatro Mvnicipal e Conservatório Dramático e Musical; inclusive, seu recital no Mvnicipal foi precedido de uma palestra de Mário de Andrade, na qual o eminente escritor e musicólogo paulistano dissertou sobre a obra do compositor carioca. Esteve ainda em Campinas, Sorocaba e Tatuí. Na ocasião, entusiasmado com as atenções a ele dispensadas, verdadeiramente consagratórias, tratou de ver publicados, entre outros títulos, os “tangos” Desengonçado, Paulicéa, como és formosa!..., Quebra-cabeças, e mais as valsas Celestial, Dirce e Elegantíssima.
Onze meses depois, portanto em março de 1927, retornou ao Rio de Janeiro, trazendo, consigo, os manuscritos dos “tangos” Cruzeiro, Cubanos e Paraíso (estilo milonga). Nesse ano, também editou o “tango” Proeminente, dedicado ao pianista polonês Mieczyslaw (“Miécio”) Horszowski.
No mês de dezembro de 1928, levando-se em conta a data da publicação de sua primeira música, Ernesto Nazareth completou cinqüenta anos de atividades artísticas.
Aos cinco de maio de 1929, faleceu de causas naturais, aos 74 anos, sua esposa Theodora Amália. E entre o final desse mesmo ano e o princípio do seguinte, Ernesto Nazareth ainda compôs três marchas carnavalescas: Exuberante, Crises em penca e Comigo é na madeira.
Em maio de 1930, terminou aquela que seria a sua última composição: a valsa Resignação. Em setembro, aceitando convite feito por Eduardo Souto, então diretor artístico da Odeon-Parlophon, gravou Apanhei-te, cavaquinho!..., Escovado, Nenê e Turuna, sendo comercializado somente o disco que continha as duas primeiras músicas.
No ano seguinte, apresentou-se em programas das rádios Sociedade do Rio de Janeiro (atual Rádio MEC) e Mayrink Veiga.
Aos 5 de janeiro de 1932, deu recital somente de músicas suas no Studio Nicolas, à Rua Alcindo Guanabara, nº 55, 2º andar. Poucos dias depois, em companhia da filha Eulina e da amiga Maria Mercedes Mendes Teixeira, partiu de navio para o Rio Grande do Sul, vindo a se apresentar em Porto Alegre, Rosário e Sant’Anna do Livramento. Nessa ocasião, levava na bagagem sua última composição editada, Gaúcho, “tango brasileiro” oferecido “Ao Nobre Povo Gaúcho”.
Encerrada a turnê, rumou para Montevidéu, capital do Uruguai, de onde embarcaria de volta ao Rio de Janeiro. Todavia, durante um passeio por aquela cidade, sofreu séria crise nervosa dentro da casa de instrumentos musicais de Julio Mousqués.
Já no Rio, após alguns exames, diagnosticou-se a sífilis. E diante da irreversibilidade do quadro neurológico apresentado, foi o maestro internado primeiramente na Fundação Gaffrée & Guinle, à época funcionando em um dos pavilhões do Hospício D. Pedro II, na Praia Vermelha, e, mais tarde, aos 4 de março de 1933, na Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá; de lá fugiu em 1º de fevereiro de 1934, vindo a falecer, possivelmente no mesmo dia, afogado nas águas da represa que ainda existe na floresta situada aos fundos deste manicômio. Seu corpo foi encontrado no dia 4 e sepultado no dia seguinte, no Cemitério de São Francisco Xavier. O compositor falecera com a idade de 70 anos, 10 meses e 10 dias.
Ernesto Nazareth deixou para a posteridade 88 “tangos”, 41 valsas, 28 polcas e mais hinos, sambas, marchas, quadrilhas, “schottisches”, “fox-trots”, romances, entre outros gêneros, perfazendo um total de 211 composições de autoria confirmada.