Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
UM PEIXE EM CASCADURA
UM PEIXE EM CASCADURA
Em outra ocasião, ainda à Rua Coronel Rangel, após receber o velho mestre, acomodá-lo em confortável poltrona e oferecer-lhe um copo d’água, Gabriella quis saber se ele já havia almoçado. Sem jeito, disse a ela que não, mas que, de forma alguma, se preocupasse com isso. Com muito custo, a ex-discípula procurou convencê-lo de que não seria trabalho nenhum, que não custaria nada lhe servir algo, pois a comida, mesmo tendo a família já almoçado, ainda estava quente. Ele, então, muito sem graça, aceitou.
Nazareth era do tipo de pessoa que preferia “morrer” a incomodar alguém, ainda que fosse uma coisa mínima e envolvesse conhecidos de longa data.
Gabriela caminhou até a cozinha e para incrementar o que sobrou do almoço, mandou que a empregada fosse ao mercadinho, ali próximo, e comprasse um peixe para servir ao músico.
Ao retornar à sala, deu-se início às conversas.
Sobre o piano inglês da casa, um Aeolian de armário, havia pequenos bustos de compositores e a dona da casa, em dado momento, disse que ali estava faltando um: o de Ernesto Nazareth. Ele, como resposta, sorriu. Pouco depois, falavam a respeito das “Sete Maravilhas do Mundo”, e o compositor falou:
- Se houvesse uma oitava maravilha, esta seria o piano!...
CARVALHO, Nair. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro, 16 de julho de 1984;
Voltando à cozinha, Gabriela fez a mais insólita recomendação a criada: a de que o peixe, quando estivesse pronto, fosse servido sem um pedaço, para que o maestro não desconfiasse que tal iguaria fôra especialmente preparada para ele... E quão surpresa não ficou a dona da casa ao chegar à mesa, acompanhada do visitante, e perceber que o apetitoso peixe estava sem o rabo!...
Ernesto, que não disse nada, deve ter pelo menos se perguntado: quem teria comido o rabo do peixe, no almoço?...