Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
GABRIELLA CRUZ
GABRIELLA CRUZ
Nascida em 21 de abril de 1878, Gabriella Eugênia Ferreira da Cruz, filha do Almirante Gabriel Ferreira da Cruz, herói da Guerra do Paraguai, contava mais ou menos com 25 anos quando, por indicação do Senador Pinheiro Machado, passou a ter aulas com Ernesto Nazareth.
Por volta de 1908, casou-se com Marcolino Fagundes, futuro General de Artilharia, Comandante da Fortaleza de São João (situada aos pés do Pão de Açúcar) e com quem teve duas filhas: Nair (1909/1985) e Zillah. Faleceu em 1959, com aproximadamente oitenta e um anos.
Minha mãe, Gabriella Cruz Fagundes, foi aluna dileta de Ernesto Nazareth. A ela dedicou, o mestre, uma de suas mais belas valsas: “Coração que sente”. O título deve-se à extrema emotividade de Gabriella, sobretudo quando tomou conhecimento, através à narração do Professor Nazareth, dos últimos momentos de vida de um seu sobrinho, morto prematuramente, na flor da idade, acometido de insidiosa moléstia, que o levou para sempre do mundo. Gabriella acompanhou as diversas fases de sua doença, quando Nazareth descrevia-lhe os sofrimentos do sobrinho. E, por ocasião do infausto acontecimento, Nazareth revelou-lhe os detalhes de suas últimas horas. Contou que o jovem pediu-lhe para dar um passeio, em vitória, pela cidade. Já dentro do carro, ansioso, presa de dispnéia, com olhar febril e os dedos gelados agarrados às bordas do veículo, contemplava os pontos onde antes se reunia a “jeunesse doré” da época: o Largo de São Francisco, a Politécnica, o Largo da Carioca e as bicas das lavadeiras, o Teatro Lírico, o Convento da Ajuda, o Passeio Público, os jardins... Sorria para tudo, para o mundo que se descortinava aos seus olhos, já quase distanciado da vida e dizia: “ - Como tudo é belo, tio - parece uma das suas músicas: a mesma harmonia, a mesma sonoridade - e os acidentes, tão difíceis de transpor!... Muito verde, muita flor... é lindo!...” Gabriella chorou copiosamente a essa descrição. Dizia em prantos: “ - Que pena! Tão jovem e belo, é injusto!” Nazareth sensibilizou-se: “ - Você é muito sensível, Gabriella - é um coração que sente!” Na semana seguinte, dia de sua lição de piano a Gabriella, Ernesto Nazareth trouxe-lhe o manuscrito da valsa “Coração que sente”, a ela dedicada.
Nair Carvalho
CARVALHO, Nair. Depoimento por escrito enviado especialmente para o autor. RJ, 8 de julho de 1984;
Quanto às informações prestadas por Dona Nair, podemos complementá-las com a seguinte versão de Dona Julita:
Tio Ernesto havia faltado algumas aulas, por causa do falecimento de meu irmão “Gigi”. E, ao recomeçar, explicou a Gabriella o motivo das faltas. No final daquele mês, no dia do pagamento das aulas, tio Ernesto ficou muito emocionado porque Gabriella pagou até pelas aulas que ele não tinha dado. Daí, então, ele dedicou a ela a valsa “Coração que sente”. Honesto do jeito que tio Ernesto era, ele, certamente, deveria estar precisando muito daquele dinheiro para aceitá-lo sem ter dado as aulas a ele correspondentes, ainda que fosse uma quantia insignificante. O gesto de Gabriela, verdadeiramente, sensibilizou-o.
Julita Nazareth Siston
NAZARETH SISTON, Julita. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro, s/d;