Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
MOACYR SILVA
MOACYR SILVA
O Dr. Fragoso era médico e morava no Rio. Gostava de ouvir Nazareth na sala de espera do Cinema Odeon. Depois mudou-se para S.Paulo. Meu pai também veio do Rio, mais ou menos em 1915. Nazareth ficou hospedado, cerca de mês e meio, na casa do Fragoso, depois foi para a nossa casa. Meu pai alugou um piano só para o Nazareth tocar. Ele, à noite, gostava muito de ir ao Parque Antárctica, onde havia uma cervejaria, e voltava tarde. Gostava de fazer “noitadas”. Tocava muito Chopin e o “Hino” de Gottschalk. Em dado momento da música ele dizia:
“ - Prestem atenção, os soldados estão marchando!... - Ouçam os tambores!... - Agora chegaram os canhões, é a batalha final!...”
Ele procurava dar vida a certas passagens daquela música. Quando compunha, ele ía tocando e escrevendo. Para ouvir, ele fazia concha com a mão. Nós (da família) conversávamos muito à hora do jantar, e eu, há algum tempo, vinha observando que quase sempre Nazareth pegava um palitinho de dente e discretamente guardava-o no bolso do paletó. Eu, então, mesmo sendo uma criança muito tímida, mas, certamente, querendo deixá-lo sem graça, de molecagem mesmo, perguntei, na frente de todos, por que ele fazia aquilo... Ele, com a maior naturalidade, respondeu:
“ - Toda vez que eu tomo banho, por mais que eu me ensaboe, sempre fica uma sujeirinha no meu umbigo... Por isso, tenho que apelar para o palitinho!...”
O piano era preto, acho que Pleyel. Ele usava um pince-nez, de vez em quando, quando tinha que ler alguma partitura. Elegante, estava sempre com um terno preto. Sua voz era suave. Ele era uma pessoa educada, mas gostava de uma cervejinha... Tinha um piano no Parque Antarctica e Nazareth sempre que ía lá dava uma “canja”.
Não era alto. 1,65m ou 1,70m. Ele tocava com muita elegância. Era, também, muito ágil. O (Arthur) Moreira Lima soca o piano. Carolina (Cardoso de Menezes) toca mais parecido.
Nunca me esqueço que no dia em que ele foi embora. Ele comprou uma caixa de lápis-de-cor para a filha dele, a Eulina. Mas você (Luiz Antonio) me diz que ela já estava com 40 anos... É, no mínimo, curioso!... Por que, então, ele compraria um presente desses para uma mulher de 40 anos?...
Moacyr Silva
SILVA, Moacyr. Entrevista concedida ao autor. RJ, 14 de agosto de 1989;