Ernesto Nazareth - Vida e Obra - por Luiz Antonio de Almeida
CHARLES LUCIÈN LAMBERT
CHARLES LUCIÈN LAMBERT
Por volta de 1881, com os proventos de suas músicas, Ernesto resolveu tomar “lições de aperfeiçoamento” com o renomado mestre Lucièn Lambert, ou melhor Charles Lucièn Lambert, nascido em New Orleans, entre 1828 e 1829.
Filho, possivelmente, de uma negra livre da Louisiana e de Charles Richard Lambert, morto em 1862, Charles Lucièn recebeu do pai, juntamente com seu meio-irmão, Sidney, dez anos mais moço, suas primeiras lições de piano.
Charles Lucièn e Sidney sentindo-se vítimas de preconceito racial, viram-se obrigados a desenvolver suas respectivas carreiras longe da terra natal.
Em 1854, Charles Lucièn, ou simplesmente Lucièn, já residia em Paris, tendo, naquela capital, publicado as composições: “Monastère do au de L'Angélus: Prière”, para piano, e “Variations et final sur l’air ‘Au Clair de la Lune’ Op. 30.”
No ano de 1858, nasceu seu filho Lucièn-Léon Guillaume Lambert, também conhecido por Lucièn Lambert Jr. E mais tarde, depois de 1862, Lucièn veio com a família para o Rio de Janeiro, onde abriu uma casa de música e passou a lecionar, tornando-se, posteriormente, membro do Imperial Conservatório de Música.
Em 1869, Gottschalk, fraterno rival de Lambert, desde os tempos da Lousiana, chegou ao Rio para uma série de concertos espetaculares. E Lucièn, juntamente com seu filho “Lucianinho”, com a idade de aproximadamente onze anos, foram convidados a participar de pelo menos um desses eventos, o do “Grande Concerto”, realizado no Theatro Lyrico, no qual 31 pianistas e duas orquestras se apresentaram simultaneamente.
Cusiosamente, todos os registros bibliográficos no Brasil apresentam Lambert como francês; tendo, inclusive, Mário de Andrade, a ele se referido como “papá” Lambert. E em nenhuma dessas publicações encontramos comenários sobre a sua etnia.
ILLUSTRAÇÃO BRASILEIRA. Ernesto Nazareth. Mário (Raul) de (Morais) Andrade. Anno IX - nº 94. Rio de Janeiro, junho de 1928;
No encarte de um excepcional CD, o biógrafo Lester Sullivan, pesquisador da Universidade de Xavier, em New Orleans, encerra seus tópicos nos surpreendendo com as seguintes palavras traduzidas do inglês:
Lucièn tornou-se eventualmente um bom amigo da família do jovem Ernesto Nazareth e primeiro professor profissional desse grande compositor brasileiro. Agora que a música de piano de Nazareth está passando por um revival em gravações, torna-se cada vez mais evidente que (Nazareth) pode ter herdado de Lambert não somente seu amor por Chopin, mas também uma inclinação para o estilo que, acoplado a exemplo de Gottschalk, na área de cor local (ou temática nativa), sugere uma linha de influência de Lambert e Gottschalk em Nazareth, seguida por Heitor Villa-Lobos e mesmo Darius Milhaud.
Lester Sullivan
SULLIVAN, Lester. Encarte do CD “American Classics - Charles Lucièn Lambert, Sr. (c.1828/1896) - Lucien-Léon Guillaume Lambert, Jr. (1858/1945) - Ouverture de Brocéliande and other works - Naxos 8.559037 (USA). These recordings feature the Hot Springs Music Festival, conducted by Richard Rosenberg.
Lucièn Sr. eventually became a good friend of the family of the young Ernesto Nazareth (1863-1934) and that great Brazilian composer's first professional teacher. Now that Nazareth's piano music is enjoying a revival on recordings, it becomes increasingly evident that he may have gained from Lambert not only his love for Chopin but also an inclination towards the pianola style, which, coupled with Gottschalk's example in the area of local colour, suggests a line of influence from Lambert Sr. and Gottschalk to Nazareth and thence to Heitor Villa-Lobos and even Darius Milhaud.
Lester Sullivan
SULLIVAN, Lester. Encarte do CD “American Classics - Charles Lucièn Lambert, Sr. (c.1828/1896) - Lucien-Léon Guillaume Lambert, Jr. (1858/1945) - Ouverture de Brocéliande and other works - Naxos 8.559037 (USA). These recordings feature the Hot Springs Music Festival, conducted by Richard Rosenberg.
Todavia, vendo-se obrigado a viajar com urgência à Paris, Lambert só pôde ministrar ao jovem Nazareth algo em torno de oito aulas. E Mário de Andrade, mais de quarenta anos depois, falou-nos de um conselho que o nosso artista teria recebido de seu ilustre mestre:
- Pinta as hastes das notas mais de pé, Ernesto!...
ILLUSTRAÇÃO BRASILEIRA. Ernesto Nazareth. Mário (Raul) de (Morais) Andrade. Anno IX - nº 94. Rio de Janeiro, junho de 1928;
Tal frase, a princípio, parece-nos sem importância. Mas, se foi repassada ao Mário pelo próprio Ernesto, não devemos desconsiderá-la. Acredito, inclusive, que o compositor tenha tocado neste assunto apenas para mostrar ao musicólogo paulista, e com certa ironia, a única coisa realmente útil aprendida com aquele professor.
Por sua vez, o pianista Marcelo Verzoni chama-nos a atenção para o fato de que recomendar a alguém para pintar “as hastes das notas mais de pé...” não se aplica, exatamente, a lições de aperfeiçoamento, mas, sim, a lições de composição!
Charles Lucièn Lambert teria falecido no Rio de Janeiro, aos 30 de abril de 1896, deixando algumas composições, entre a quais: “Bresiliana, Grande valse brilliante de salon”; “L’Amazone, Caprice-mazurka Op 67”; “Le Castillian, Bolero pour le piano”; “L’Americaine, Grande valse brilliante”; “Le Calabrais, Galop brilliant Op 39” e a já citada “Variations et final sur l’air ‘Au Clair de la Lune’ Op 30.”
No Acervo Ernesto Nazareth , encontramos uma única música de Lambert, “Voix célestes, Rêverie, Op. 40”, Ed. Colombier, Paris. Contudo, não podemos dizer se esta peça, cujo exemplar vem com o carimbo da Viúva Canongia, fazia parte do repertório do nosso artista ou seria, simplesmente, uma recordação do velho mestre.
ACERVO ERNESTO NAZARETH. Instituto Moreira Salles, Rio de Janeiro;